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A estabilidade democrática

O amadurecimento de uma nação se acelera proporcionalmente ao número de eleições livres e transparentes que realiza.

Temos três marcos temporais muito evidentes que salvo melhor juízo, serviram para moldar o quadro atual da vida social política brasileira. A Proclamação da República, A Revolução de 1930 e a Constituição de 1988.

A Proclamação da República (1889) trouxe a primeira reforma eleitoral substancial através da Lei Saraiva, que na verdade era um Decreto – nº 3.029/1881. Dentre as mudanças, a que mais se destaca, é a retirada da renda pessoal do cidadão como requisito para poder se candidatar. Se o cidadão não tinha posses, estava impossibilitado de se candidatar. Isso possibilitava a candidatura somente de homens ricos. Contudo, a exclusão dos analfabetos e das mulheres, que representavam a maior parcela da população foi mantida.

Na Primeira República (1889-1930), as eleições notoriamente eram marcadas pelas fraudes e tinham baixíssima adesão popular, uma vez que menos de 6% dos eleitores participavam da votação. Por ser uma novidade trazida pela república, os pleitos estavam vinculados ao sistema coronelista e o voto ficou conhecido como “voto de cabresto”, isso porque o voto era aberto, sem sigilo, fator que permitia que lideranças políticas controlassem em quem os eleitores votavam.
A primeira eleição para presidente foi indireta (1891), sendo proclamado e nomeado o marechal Deodoro da Fonseca pela Assembleia Constituinte, e o seu mandato foi concluído pelo vice – Floriano Peixoto.

Os 11 presidentes que o seguiram todos foram eleitos de forma direta. Prudente José de Moraes e Barros foi o primeiro ocupante da cadeira eleito por votação popular e obteve 276.583 votos no pleito realizado no dia 1º de março de 1894.

Por sua vez, a primeira distensão no regime eleitoral criado pela República se deu com a eleição ocorrida em 1º de março de 1930, na qual Júlio Prestes de Albuquerque e Getúlio Vargas disputaram a eleição presidencial. Prestes foi o mais votado, com 1.091.709 votos, mas não chegou a ser empossado. Denúncias de fraude eleitoral mobilizaram opositores do presidente recém-eleito, que não aceitaram o resultado do pleito. A partir disso, um movimento armado derrubou o governo de Washington Luís e impediu que Prestes ocupasse o cargo. No dia 24 de outubro daquele ano, Vargas assumiu como presidente provisório.

Getúlio foi alavancado ao poder pelos descontentes para reestruturar o sistema eleitoral e promover eleições lisas e transparentes no prazo de dois anos. No entanto o governo provisório se convolou no Estado Novo, que perdurou até 1945.

Nesse interim, em 1932, foi editado o Código Eleitoral que trouxe inovações como o voto feminino e a eleição proporcional para os parlamentos, que quebrou o regime de alternância de poder do Café com Leite (São Paulo e Minas). Foram as mudanças mais substanciais no regime eleitoral desde sua implantação.

No entanto, com a instalação do Estado Novo por Vargas, foi ditada a Constituição Federal de 1937, conhecida como “Polaca” que extinguiu a Justiça Eleitoral e determinou a realização de eleições indiretas para a Presidência da República, durando o estado de exceção até 1945.
Nesse ano, frente a forte oposição política de diversos setores – incluindo a alta cúpula militar – e a iminente vitória de nações democráticas na Segunda Guerra Mundial, Getúlio Vargas pressionado, deu início ao processo de abertura política culminando com sua renúncia em outubro desse mesmo ano. Com isso, foi restabelecido o Código Eleitoral e após oito anos foram realizadas eleições diretas novamente, a primeira realmente sob a batuta da Justiça eleitoral.
Retomadas as eleições diretas, foi eleito Eurico Gaspar Dutra com o apoio do Parido de Getúlio Vargas, o PTB, que em 1951 retorna ao governo eleito diretamente pelo voto popular e se suicida em 1954.

Em 1955 é eleito Juscelino Kubistchek e na sua sequência Jânio Quadros, em 1960, sendo a última antes da instauração do Regime Militar. Jânio escolhido democraticamente com a maior quantidade de votos até então (5.636.623), renunciou ao cargo pouco menos de sete meses depois de ter sido eleito. O vice-presidente, João Goulart, assumiu a cadeira, sendo neste momento criado por breve espaço de tempo, o sistema parlamentarista, no qual Tancredo Neves assume como Primeiro Ministro.

Descontentes com o governo Goulart, em 31 de março de 1964, os militares deslocaram tropas de Minas Gerais e de São Paulo para o Rio de Janeiro, onde estava o presidente. No dia seguinte, a Presidência foi declarada vaga pelo Congresso Nacional e, com isso, deu-se início a uma série de providências para eleição do sucessor que completaria o mandato do presidente deposto. Assume então a presidência, Humberto Castelo Branco que inaugurou a lista de 7 presidentes eleitos indiretamente, seguidos por Costa e Silva em 1967; Emilio Garrastazu Médici em 1969; Ernesto Geisel em 1974, João Figueiredo em 1979 e Tancredo Neves em 1985. Nesse período dois presidentes faleceram, Costa e Silva em 1969, sendo sucedido pela junta militar que não aceitou o vice, Pedro Aleixo assumir, pois era civil, e também Tancredo Neves que faleceu antes de tomar posse, mas mesmo assim foi convalidada sua ascensão ao cargo de presidente para então dar posse ao seu vice, José Sarney.

Após esse estado de exceção, em 1988 é editada a nova constituição que reestabelece de forma plena a eleição direta para todos os cargos parlamentares (vereadores, deputados estaduais e federais) e do executivo (prefeito, governador e presidente). Na primeira eleição dessa nova era constitucional, se elege Fernando Collor de Mello que sai do cargo pelo primeiro processo de impeachment da República Federativa do Brasil, acendendo então ao cargo Itamar Franco, tendo sido sucedido por Fernando Henrique Cardoso, que inaugurou a figura da reeleição no nosso País (eleito em 1994 e reeleito em 1998).

Nas eleições diretas de 2002, sai vencedor Luís Inácio Lula da Silva, considerado então como a representação da esquerda nacional, sendo reeleito em 2006. Em 2010 se elege Dilma Roussef que obtém a reeleição em 2014. É deposta pelo segundo processo de impeachment da nossa República, assumindo então Michel Temer que entregou a faixa presidencial ao Presidente eleito em 2018, Jair Messias Bolsonaro.

Chegamos então a eleição de 2022, que certamente tem revivido os momentos turbulentos da república velha. Apesar da nossa República ter comemorado 133 anos de existência no último dia 15 de novembro, a tensão que permeia o ar nesse momento demonstra que só não evoluímos mais rapidamente no aprimoramento das instituições democráticas, entre elas as eleições livres, haja vista os recorrentes períodos de exceção (sem eleições livres) que a República viveu até hoje.

A democracia é um valor que não se exerce apenas na eleição. É um processo contínuo, que precisa ser consolidado diariamente. Independente das idéias políticas que defendam, os brasileiros tem que demonstrar interesse para encarar a missão civil de defender seus pontos de vistas e acima de tudo, respeitar os pontos de vista adversos. Cidadania e voto são conceitos que se equivalem, pois são pedras angulares do estado democrático de direito.

As eleições livres e continuadas tem o poder de conscientizar o cidadão da sua posição privilegiada de poder escolher seus representantes, colocando-o, assim, em posição central de decisão.

Feito esse breve retrospecto, e analisando os números do segundo turno da disputa para Presidente, onde visualizamos 20,6% de abstenção e a soma dos nulos em brancos em outros 4,59%, fica a pergunta:

Quantas eleições livres ainda serão necessárias para que possamos dizer que o Brasil amadureceu democraticamente?

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