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Protestos em Cuba: Entenda o que acontece no país liderado pelo comunismo

Em entrevista à BBC, rapper diz que o “Povo cansou e não aguenta mais”

Informações El País, BBC, ABC e CNN Internacional

Foto: Yusnaby Pérez / Reprodução Twitter

Cuba viveu no domingo (11) as maiores manifestações das últimas décadas. Pelas ruas de várias cidades diversos gritos de “Abaixo a ditadura” e “Pátria e vida”, uma referência ao lema oficial do regime, “Pátria ou morte”, os cubanos saíram às ruas para protestar contra a mistura explosiva da carência de alimentos e da falta de vacinas contra a covid-19. 

A crise econômica que a ilha sofre há anos foi agravada pela pandemia que afetou gravemente o setor do turismo. Estes são alguns dos aspectos essenciais que ajudam a entender como se desencadeou essa explosão, estimulada e ampliada em todo o mundo pelas redes sociais, um desafio para o presidente Miguel Díaz-Canel, herdeiro de Fidel e Raúl Castro, e o primeiro líder em 62 anos de regime que não vivenciou a revolução.

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Onde surgem os protestos e o que os manifestantes pedem?

Foto: Yusnaby Pérez / Reprodução Twitter

Centenas de cubanos começaram a protestar no domingo nas cidades de San Antonio de los Baños, perto de Havana, e Palma Soriano, em Santiago, uma faísca que mais tarde se espalhou por todo o país. Em princípio, era um protesto contra os longos apagões de eletricidade e para pedir vacinação contra a covid-19. Logo depois, as demandas se transformaram em gritos por “liberdade” e exigências de mudanças políticas.

O protesto chegou ao Facebook e foi transmitido ao vivo, com slogans inusitados, como “Abaixo a ditadura” e “Não temos medo do comunismo”. Em vários pontos, como Cárdenas, a oeste da ilha, houve saques a lojas do Estado e ataques a carros da polícia.

O Governo reprimiu duramente os protestos e convocou os revolucionários a lutar contra as manifestações nas ruas, o que resultou em mais de uma centena de presos. Um fotógrafo espanhol da agência Associated Press (AP), Ramón Espinosa, foi atacado por agentes da ordem.

Como a covid-19 afeta Cuba? 

Os protestos parecem ser o resultado do esgotamento causado pela longa crise econômica e sanitária, uma das piores da ilha desde o maleconazo de 1994, durante o chamado Período Especial, após a queda da URSS, quando centenas de cubanos saíram às ruas para protestar por causa da situação precária às vésperas da eclosão da crise dos balseiros. 

A ilha conseguiu manter o controle da pandemia em 2020 (contabilizou apenas 1.500 mortes) e liderou a criação de uma vacina própria (embora com uma distribuição precária), mas vem passando nas últimas semanas por um surto da doença que o coloca entre os mais perigosos da América Latina. 

No domingo, as autoridades informaram que havia 7.000 casos e 31 mortes, embora a oposição afirme que os dados reais são muito piores e que muitas áreas estão à beira de um colapso sanitário.

Uma economia estagnada 

Foto: Yusnaby Pérez / Reprodução Twitter

Com o motor econômico, o turismo, totalmente em recessão, a incidência do coronavírus se soma à inflação, aos apagões e à escassez de alimentos e produtos básicos. Em 2020, a economia se contraiu 11%, o pior dado em três décadas. No início do ano, o Governo cubano propôs um novo pacote de medidas econômicas que aumentaram os salários e as aposentadorias, mas também os preços. 

Na ausência de divisas, foram criadas lojas em moeda livremente conversível —onde só é possível pagar com cartão de crédito— nas quais se vendem alimentos e eletrodomésticos, enquanto nas lojas de pesos cubanos há cada vez menos produtos. Desde o mês passado não estão sendo aceitos “temporariamente” dólares em dinheiro, principal moeda com que os cidadãos recebem suas remessas. Havana culpa pela situação o embargo dos Estados Unidos.

De onde vem o lema “Pátria e vida”? 

Foto: Yusnaby Pérez / Reprodução Twitter

Arremedo do lema oficial castrista, o rap Pátria e vida se tornou a trilha sonora dos protestos. Obra dos rappers cubanos Maykel Osorbo e El Funky —que vivem na ilha— em conjunto com músicos exilados em Miami, como Gente de Zona, sua letra irreverente (“Não vamos mais gritar ‘Patria ou morte’, mas ‘Pátria e vida”) é um poderoso vídeo de lançamento em que se queima um desenho do herói cubano José Martí e um dólar (”Trocando Che Guevara e Martí pela moeda conversível, diz a canção), além de mostrar os dissidentes do Movimento San Isidro, teve maior repercussão mundial desde seu lançamento em fevereiro do que manifestos anteriores.

Cuba depois dos Castro 

É a primeira vez aos 62 anos de história do regime castrista que o Governo e a cúpula do PCC se alinham em torno de um civil e de uma nova geração de líderes que não lutaram na Sierra Maestra. 

Após a morte de Fidel Castro, em 2016, e a consequente aposentadoria de Raúl Castro do cargo de primeiro secretário do partido em 2021, Miguel Díaz-Canel, que já ocupava o cargo de presidente desde 2018 e será sucedido como chefe de Estado em 2028, tem a difícil tarefa de manter o poder nas mãos do partido em uma conjuntura crítica. 

Para isso, há dois homens-chave com trajetória empresarial: o primeiro-ministro Manuel Marrero, que esteve à frente do Turismo, e Luis Alberto López-Callejas, no comando do GAESA (o grupo empresarial do Exército).

Repercussão entre líderes da América Latina? 

A América Latina reagiu de forma desigual aos protestos. Enquanto o Executivo mexicano chefiado por Andrés Manuel López Obrador defendeu como solução prestar ajuda ao povo cubano com “remédios, alimentos e vacinas”, o presidente brasileiro Jair Bolsonaro vincula a situação de Cuba à da Venezuela. “Eles nos enviaram médicos quando precisávamos, centenas de médicos que salvaram vidas”, disse, referindo-se à crise da covid-19. 

Já Bolsonaro associou a repressão ao comunismo. “Sabe o que eles tiveram ontem? Borrachada, pancada e prisão”, declarou. Crítico de Havana, o presidente colombiano Iván Duque não se manifestou —assim como seus homólogos de Chile, Sebastián Piñera, e da Argentina, Alberto Fernández. 

Do Ministério das Relações Exteriores argentino, limitaram-se a informar que estão “acompanhando atentamente a evolução dos acontecimentos”. O silêncio oficial inclui a vice-presidenta Cristina Fernández de Kirchner, que mantém uma relação estreita com o regime castrista.

Grupos próximos ao Governo de Cuba tomam as ruas para silenciar o protesto

Duas mensagens que foram divulgadas na terça-feira (13) no Twitter pelo presidente cubano, Miguel Díaz Canel, refletem a tensão que vive a ilha depois dos inéditos protestos de domingo. 

A primeira diz: “A revolução cubana não vai dar a outra face a quem a ataca em espaços virtuais e reais. Evitaremos a violência revolucionária, mas reprimiremos a violência contrarrevolucionária. Quem ataca os agentes da ordem, ataca o país”. 

Na segunda, afirma: “A contrarrevolução sonha com uma guerra entre cubanos” e acrescenta: “Não vamos lhes dar esse prazer”.

Embora as ruas da capital e das principais cidades do país tenha amanhecido novamente calmas — ainda que com forte mobilização policial—, às manifestações que em 11 de julho sacudiram diferentes cidades e vilarejos do país já se instalaram no imaginário coletivo, a ponto de marcar um antes e um depois. 

Desde segunda-feira (12), após o chamamento do Governo, vários grupos afins ocuparam parques e espaços públicos para encenar sua adesão à revolução. No Capitólio Nacional, ao lado do parque da fraternidade, onde no domingo aconteceram os distúrbios mais importantes, mais de uma centena de pessoas se reuniram ao grito de “Viva Fidel!” como compensação pelo ocorrido na véspera. 

Em alguns bairros periféricos de Havana onde houve um princípio de protesto, como Arroyo de Naranjo, saíram grupos leais ao Governo armados com paus e tacos de beisebol, como aconteceu durante o Maleconazo, protesto ocorrido em 5 de agosto de 1994 que levou à crise dos balseiros [nome dado aos que se aventuravam no mar em botes improvisados].

Naquela ocasião os tumultos no Malecón não ganharam maiores proporções porque os chamados “destacamentos de resposta rápida” saíram às ruas e impuseram a ordem com golpes, e então mais de 30.000 cubanos se lançaram ao mar. 

Sem esse desenlace até o momento, os protestos de domingo não têm precedentes, tanto pelo tamanho e dispersão quanto pela grande repercussão que tiveram graças aos alto-falantes do Facebook, Instagram e WhatsApp, que o Governo de Havana considera como gasolina incendiária neste momento. Um dos efeitos mais claros é que desde a noite de domingo é quase impossível conectar-se à internet pelo celular.

O impacto do que aconteceu foi grande no país. E se nas ruas, nas casas e nos centros de trabalho não se fala de outra coisa, o mesmo acontece nas hierarquias políticas. Um exemplo do ponto que as autoridades levaram a sério as manifestações é a reunião realizada na tarde de domingo pelo Birô Político do Partido Comunista Cubano, à qual esteve presente Raúl Castro, embora o ex-presidente não faça mais parte desse organismo.

 “Durante o encontro foram analisadas as provocações orquestradas por elementos contrarrevolucionários, organizados e financiados desde os Estados Unidos com propósitos desestabilizadores”, disse um comunicado publicado nesta terça-feira pelo jornal oficial Granma. 

Tanto no Maleconazo quanto nos últimos protestos, o pano de fundo é o mesmo: o grande descontentamento popular devido às dificuldades econômicas e à crise que atravessa o país, que provocou um grave desabastecimento e filas de horas para comprar artigos de primeira necessidade, escassez de remédios e todo tipo de alimentos, a volta dos apagões por avarias em várias termelétricas, e uma situação agravada ainda mais pelo pior surto da epidemia de coronavírus —nesta terça-feira a marca dos 5.000 casos foi superada novamente—, que colocou o sistema de saúde cubano contra as cordas. E essas condições não vão melhorar no curto prazo.

O Governo cubano reconhece o mal-estar dos cidadãos, mas acusa os EUA de estarem por trás do ocorrido e da manipulação das redes sociais para favorecer a desestabilização do país. O ministro das Relações Exteriores, Bruno Rodríguez, disse que o que aconteceu no domingo em Cuba não foi “uma explosão social; houve distúrbios, desordem. Até a imprensa internacional reconhece que houve atos de violência nos distúrbios, mas não a explosão social pela qual o Governo norte-americano trabalhou, de maneira oculta ou mais publicamente nos últimos tempos”.

A tensão é palpável nos discursos e nas redes sociais, a polarização é cada vez maior. Desde segunda-feira, dezenas de jovens que tinham sido presos na véspera começaram a ser libertados, mas não se sabe quantas pessoas continuam detidas. Um cálculo da agência France Presse estima esse número em 130.

O dramaturgo Yunior García, um dos ativistas do chamado 27N, que foi preso às portas do Instituto Cubano de Rádio e Televisão, escreveu assim que foi posto em liberdade:

“Nos múltiplos interrogatórios que vivemos, ficou claro que ninguém de fora nos orientou a sair à rua, que absolutamente ninguém nos pagou um centavo para fazer o que fizemos. Mas também deixamos muito clara a nossa posição e as nossas ideias de mudança, em um país que não para de cair no precipício, com uma aguda crise sanitária, sem remédios nem comida, com uma inflação galopante, uma dívida impagável, lojas em moeda estrangeira que se expandem como polvos, um país que se enche de hotéis enquanto o fundo habitacional sofre um perigo perene de colapso e os hospitais não são suficientes. Um povo em meio ao qual cresce o descontentamento, o desabastecimento crônico, os apagões, os presos de consciência”.

Como redes sociais foram cruciais em manifestações históricas

“A internet continua cortada, não sei onde muitos dos meus amigos estão”, disse um dos manifestantes que gravou e compartilhou vídeos dos protestos recentes em Cuba.

A restrição parcial do acesso à rede e o bloqueio seletivo das redes sociais têm dificultado o fluxo de informações na ilha, após os históricos protestos de domingo (11/7) em que os manifestantes transmitiram “ao vivo” o que se passava em diferentes pontos do país.

Foi assim que o governo do presidente Miguel Díaz-Canel respondeu à chamada “revolução digital” dos adversários que, desde a massificação do acesso à internet móvel entre os cubanos nos últimos três anos, têm criado canais de informação alternativos aos meios de comunicação oficiais do país.

No domingo, foi aberto um novo capítulo na história recente da ilha. Ele começou em San Antonio de los Baños e se espalhou como uma onda pelo restante de Cuba.

‘Povo cansou e não aguenta mais’, diz rapper dissidente

FACEBOOK/MAYKEL OSORBO – Reprodução BBC

Uma das vozes mais críticas ao governo cubano, o rapper Maykel Obsorbo acredita que “há coisas que estão mudando” no país. Ele foi o protagonista de uma onda de protestos no país em abril, que, como agora, questionam a legitimidade do regime e pedem por democracia. A entrevista com o rapper aconteceu no mês de abril deste ano. 

Há três meses, moradores de San Isidro, em Havana Velha, centro histórico da capital cubana, impediram a polícia de algemar e deter o artista, em uma inusitada afronta às autoridades, segundo vídeos veiculados em redes sociais.

Dezenas de pessoas seguiram o rapper até a sede do Movimiento San Isidro, grupo de jovens artistas ao qual ele pertence, e iniciaram um protesto de rua em que gritavam palavras de ordem por mudança e contra o presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel. Mas essa não foi a única manifestação de desobediência civil ocorrida recentemente.

Em Santiago de Cuba, dezenas de pessoas, lideradas pelo veterano opositor José Daniel Ferrer, lançaram uma greve de fome há algumas semanas que chamou a atenção de diferentes personalidades, governos e instituições, incluindo a União Europeia.

Osorbo costurou a boca em agosto, após ser intimado para interrogatório da polícia – Foto: MAYKEL CASTILLO / Reprodução BBC

Sua história pessoal, diz ele, é também uma amostra do que a arte pode fazer: cresceu sem pais, só chegou à quarta série, passou por centros de reeducação para menores e depois se encontrou na música e na luta pelos direitos humanos em seu país uma “razão para continuar lutando, para continuar vivendo”.

À época, ele conversou com a BBC sobre as transformações pelas quais ele afirma que seu pais está passado e que parecem mais uma vez ter levado muitos cubanos às ruas para protestar.

“O regime efetuava prisões naquele dia. Eles prenderam (a artista) Tania Bruguera e duas outras pessoas, e eu tinha ido visitar alguns amigos. Quando estava lá, um policial chegou em uma viatura e pediu documentos a um deles, pois supostamente tinham visto ele tirar a máscara um pouco antes. Disse a ele (policial) que o que estava fazendo era uma violação do estado de direito e eles me pediram minha identificação. Falei que não tenho carteira de identidade — como não tenho o documento, toda vez que me pedem, acabo preso. Não queria que me algemassem, porque na véspera também me algemaram, me bateram muito e depois me soltaram no parque como se nada tivesse acontecido. Não queria que a história se repetisse”, falou na entrevista.

Espanha exige libertação de jornalista presa durante protestos em Cuba

Reprodução/Facebook

A correspondente da ABC em Havana, Camila Acosta , foi presa na terça-feira (13), conforme confirmado à mídia independente ‘Cubanet’ pelo escritor Ángel Santiesteban. 

A jornalista foi interceptada por vários agentes da polícia política às 10h00 -4h00 na Espanha-, quando saía de casa para realizar um procedimento pessoal na companhia do pai, que necessitava de um teste PCR para detectar o Covid-19, já que ele deveria fazer uma viagem na próxima sexta-feira. Posteriormente, os agentes foram até a casa, onde fizeram uma busca e levaram todo o seu equipamento de trabalho, inclusive um computador de uso pessoal.

Como Santiesteban pôde confirmar à ABC, Acosta será processado por ” crimes contra a segurança do Estado “. Ela está detida na Quarta Unidade Policial de Infanta, município de Cerro. Acusação semelhante à enfrentada pelos dissidentes e por qualquer pessoa que apareça como suspeito perante o aparato repressivo do Castrismo. Além de Acosta, vários jornalistas foram presos, incluindo Íris Mariño, de Camagüey, e Orelvis Cabrera, de Matanzas, como soube a ABC.

Horas antes de sua prisão, Acosta havia coberto para este jornal os protestos em Cuba, em particular os que ocorreram em Havana no último domingo. No final daquele dia, a internet e suas mensagens no WhatsApp foram bloqueadas . Os cortes na Internet, muito frequentes, não respondem a causas técnicas, mas são uma ferramenta para silenciar a voz da dissidência e impedir que a população acesse a mídia estrangeira para saber o que está acontecendo em Cuba.

Não é a primeira vez que Acosta é detido pelo regime. Ele também sofreu a rejeição social , instigada em sua vizinhança pelos agentes e partidários do castrismo, que o obrigaram a mudar várias vezes de endereço. Você não pode viajar ou sair da ilha porque está sob as condições ‘regulamentadas’.

Um fotógrafo espanhol da agência Associated Press (AP), Ramón Espinosa, foi atacado por agentes da ordem de Cuba.  

O ClicRDC portal de notícias do Grupo Condá de Comunicação trará todas as informações sobre a situação do país, através de agências internacionais que acompanham a situação do país liderado pelo comunismo.

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