Em março de 2019, um homem realizou uma série de comentários preconceituosos na publicação de uma rádio local que anunciou a morte de um africano, vítima de um acidente de trânsito. Na postagem, o homem afirmou que o corpo do falecido poderia ser “jogado” em um rio que passa na cidade ou “levem embora, bota no frigorífico, pra não estragar”. O Ministério Público de Santa Catarina encaminhou denúncia contra o homem. Com base no inquérito policial do caso, o MP imputou a ele a prática do crime de discriminação e preconceito de raça, descrito no artigo 20 da Lei do Crime Racial.
O juízo da Vara Criminal da comarca de Concórdia julgou improcedente a denúncia, absolvendo o réu, sob entendimento de que o fato não constitui infração penal. O MP interpôs recurso de apelação criminal contra a sentença proferida, alegando que havia provas suficientes para a condenação do réu. Nos autos, constava que o acusado foi ouvido na via policial e afirmou que os comentários que fez na publicação “não foi com má intenção ou mesmo por ser o falecido africano”. Alegou ainda que é nascido em uma cidade pequena e possui pouco estudo, “e o ‘povo da internet’ na época não entendeu direito o que falou, a sua opinião e caiu de pau em cima”. Em juízo, o acusado permaneceu em silêncio. O filho dele foi ouvido e afirmou que o pai “falou uma besteira por estar alcoolizado”.
O desembargador, relator da matéria, destacou que o relato do homem da fase extrajudicial é suficiente para compreender o preconceito que ele sentia, e que se manifestou em comentários discriminatórios. “Ao contrário do que alega, os moradores das cidades pequenas e interioranas respeitam a diferença entre os povos e as culturas, tanto é verdade que, entre inúmeros comentários à morte da vítima, apenas as opiniões do apelado que eram pejorativas e com o cunho humilhatório”, anotou.
O magistrado acrescentou que o ato “revela-se inequivocamente, um preconceito em relação à procedência nacional, pois a frase publicada contém raciocínio de que todo povo africano deveria ser tratado de forma desumana ou expulso do país”. O réu não possui antecedentes. A pena foi fixada em dois anos de reclusão em regime aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos – prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de dois salários mínimos. A decisão da 3° Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina foi unânime.