
Há algo de simbólico — e profundamente estratégico — em ver uma marca nascida no interior de Santa Catarina conquistar a liderança nacional na categoria de frangos. A Seara, fundada em 1956 no município de mesmo nome, é hoje uma das gigantes da proteína animal no país. Mas mais do que uma estatística industrial, sua ascensão revela como inovação, branding e inteligência de consumo podem transformar uma empresa tradicional em uma potência contemporânea.
Segundo a mais recente pesquisa da Worldpanel by Numerator, a Seara alcançou 60,4% de penetração nos lares brasileiros, tornando-se a marca de frango mais presente nas mesas do país. O número é impressionante, mas o que o sustenta é ainda mais revelador: uma estratégia de longo prazo para descomoditizar o frango — o alimento mais popular do Brasil — e elevá-lo à condição de produto de desejo.
Inovar num mercado que parecia saturado
Durante décadas, a categoria de frangos se manteve estável, dominada por grandes players com foco em volume e preço. O consumidor via pouco diferencial: peito, coxa, asa, e uma rotina de preparo quase automática. A Seara, porém, percebeu que o futuro da proteína não estava apenas na produção, mas na experiência de consumo.
Produtos como o Frango de Padaria — lançado em 2021 e que pode ir direto do freezer à air fryer — são exemplos de inovação orientada ao estilo de vida moderno: praticidade, sabor e conveniência. O resultado? Crescimentos sucessivos: +290% em 2022, +110% em 2023 e +60% em 2024. A linha Suculentíssimo, por sua vez, trouxe técnicas de amaciamento e preparo antes restritas à alta gastronomia, agora acessíveis ao dia a dia.
Essas iniciativas mostram um entendimento claro: o consumidor brasileiro quer mais do que preço, quer prazer. E é justamente aí que a Seara encontrou seu diferencial competitivo.
Santa Catarina: o berço da proteína que conquistou o mundo
É impossível falar da Seara sem falar de Santa Catarina — o estado que mais exporta carne suína e que responde por cerca de 13% do abate nacional de frangos. A força agroindustrial catarinense vem da combinação entre tecnologia, cooperativismo e disciplina produtiva.
Nas granjas do Oeste, o trabalho é minucioso, o controle sanitário é exemplar e a cultura de qualidade está enraizada. Essa base sólida permitiu que a marca levasse sua reputação local para os mercados mais exigentes do planeta.
Enquanto outras regiões sofrem com oscilações sanitárias, Santa Catarina ostenta o status de zona livre de febre aftosa sem vacinação, um diferencial que se converte em confiança para o consumidor e em competitividade internacional.
Liderança que transcende o supermercado
Assumir a liderança em “presença nos lares” não é o mesmo que dominar o mercado em volume ou faturamento — mas é, sem dúvida, um sinal de poder de marca.
Estar na mesa de seis em cada dez brasileiros significa algo mais profundo: confiança, reconhecimento e afetividade.
A marca Seara aprendeu a conversar com o público. Seu discurso combina o emocional (“feito com carinho”) com o racional (segurança alimentar, praticidade e qualidade). E no jogo do marketing moderno, quem domina a narrativa, domina o mercado.
Os desafios da liderança
Toda liderança traz um novo tipo de pressão. A Seara agora precisará manter sua identidade catarinense sem se tornar genérica, e continuar inovando sem perder a eficiência operacional — especialmente em um estado onde os custos de produção de frango estão entre os mais altos do Sul do Brasil.
Além disso, há o fator global: a marca é parte da JBS, uma das maiores empresas de alimentos do mundo. Isso traz musculatura financeira e sinergias logísticas, mas também exige governança, reputação e sustentabilidade — atributos cada vez mais cobrados pelos mercados e consumidores.
Outro ponto é o equilíbrio entre escala e propósito. Quando a empresa cresce demais, há o risco de se distanciar do território emocional que construiu sua credibilidade. E Seara é, acima de tudo, uma marca de origem — uma empresa que carrega no nome o nome de sua cidade.
Mais do que uma marca, um símbolo
Em tempos de volatilidade econômica, ver uma empresa brasileira — e catarinense — conquistar liderança nacional por mérito de inovação é motivo de orgulho e reflexão.
A Seara mostra que a tradição não é um peso, é um ponto de partida.
Mostra que é possível transformar o óbvio em extraordinário, e que o sucesso nasce quando a indústria entende o que realmente está na mesa: não apenas alimento, mas identidade, confiança e afeto.
O sabor da estratégia
A liderança da Seara não é apenas um triunfo comercial, mas um caso exemplar de estratégia empresarial.
Ela soube unir o que poucos conseguem: raiz e reinvenção, volume e valor, tradição e tecnologia.
E talvez essa seja a melhor receita para o futuro do agronegócio brasileiro — um modelo que combina eficiência produtiva com inteligência de marca.
Afinal, em tempos de incerteza, quem alimenta com propósito não conquista apenas o mercado. Conquista o coração do país.