quarta-feira, outubro 29, 2025
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Javier Milei: vitória, poder ampliado e o dilema da governabilidade

Confira a coluna do professor Dr. Givanildo Silva

Prof. Givanildo Silva – Doutor em Ciências Contábeis e Administração.

A Argentina vive um momento decisivo após a vitória expressiva de Javier Milei nas eleições legislativas da última semana. O presidente liberal, que chegou ao poder prometendo desmontar o sistema político tradicional e aplicar um “tratamento de choque” na economia, obteve apoio significativo nas urnas, ampliando a presença do seu grupo no Congresso Nacional. Essa conquista fortalece sua capacidade de avançar com reformas estruturais e sustentar decretos presidenciais que já vinham sendo alvo de resistência parlamentar.

O que se nota no cenário argentino é a construção de um novo mandato político — não o que se conquista na eleição presidencial, mas aquele que se confirma quando o eleitorado, mesmo sob desgaste econômico, volta a dar crédito ao governante. O mercado financeiro reagiu com entusiasmo: valorização dos títulos públicos, moeda local menos pressionada e analistas internacionais falando novamente da possibilidade de a Argentina retomar um caminho de estabilidade. Esse apoio econômico, no entanto, costuma ser tão rápido quanto volúvel. A euforia dos investidores estrangeiros costuma durar pouco se a política interna não sustentar as reformas prometidas.

Com o avanço legislativo, Milei se aproxima de poder implementar a reforma tributária e a reforma das relações de trabalho — pilares de sua agenda liberal, que busca reduzir o peso do Estado, flexibilizar o mercado e atrair investimentos. A grande questão, agora, é como ele conduzirá o próximo passo. Sua retórica de campanha — agressiva contra o que chama de “casta política” — foi eficiente para chegar ao poder e manter sua base mobilizada, mas governar exige negociação constante, sobretudo em um Congresso fragmentado onde ele ainda não detém maioria absoluta.

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Nesse ponto, surge o dilema: para consolidar suas mudanças, Milei terá de se aproximar exatamente das forças políticas que demonizou. Ele pode escolher manter o personagem disruptivo ou adotar uma postura mais pragmática. Ambas as escolhas trazem riscos. Se tentar governar sozinho, poderá aumentar conflitos, desgastar alianças e isolar-se. Se moderar o discurso, pode ser acusado por seus próprios seguidores de traição às promessas originais. Trata-se de uma corda bamba política e emocional.

O maior desafio, entretanto, está nas ruas. A população convive com inflação persistente, desemprego elevado e empobrecimento acelerado. A tesoura fiscal do governo — corte de subsídios, contenção de gastos, redução do tamanho do Estado — produz economia de recursos públicos, mas também dor social imediata. A classe média sofre. Os mais pobres se sentem abandonados. Ninguém come promessa de futuro melhor; quem tem fome, tem pressa. Assim, a paciência do eleitor é um recurso escasso. Ele pode ter dado um voto de confiança agora, mas a continuação desse apoio dependerá de resultados concretos no curto prazo.

Para os países vizinhos, especialmente o Brasil, o caso Milei é um laboratório vivo. Ele coloca à prova a tese de que reformas profundas e rápidas podem salvar uma nação mergulhada em décadas de desequilíbrio fiscal e descrença nas instituições. Mas também revela o quanto a governabilidade e o diálogo permanecem essenciais, mesmo em projetos que se apresentam como revolucionários.

Minha opinião é que a vitória de Milei não garante o sucesso de sua agenda — apenas removeu alguns dos obstáculos iniciais. Ele ganhou fôlego, mas está sob um novo tipo de pressão: agora não pode mais culpar o sistema por seus próprios fracassos. A pergunta que fica é simples e brutal: ele conseguirá transformar apoio eleitoral em capacidade de governança? A resposta determinará se a Argentina finalmente superará o ciclo de crise permanente ou se mergulhará ainda mais fundo na instabilidade que a atormenta há décadas.

Se Milei entregar resultados, poderá ser lembrado como o líder que rompeu com o passado e recolocou o país no trilho do desenvolvimento. Se falhar, seu projeto pode se transformar em mais um capítulo turbulento da política argentina. Em qualquer caso, a história está sendo escrita diante de nossos olhos — e o relógio da esperança já começou a correr.

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