O governo do presidente Jair Bolsonaro, por meio de pareceres técnicos da Advocacia-Geral da União (AGU), da Casa Civil e do Ministério da Justiça , manifestou ser contra a concessão de indulto a um preso que decidiu acionar o Supremo Tribunal Federal ( STF ) para tentar garantir o benefício. É a primeira vez que o governo Bolsonaro, no poder há nove dias, se manifesta em relação ao indulto, o ato de concessão de perdão a penas conforme critérios previamente estabelecidos. O presidente eleito, um mês antes de tomar posse, afirmou que não concederá indulto em seu governo.
A defesa do detento que tentou um habeas corpus no STF apontou uma “coação ilegal” por parte do ex-presidente Michel Temer. Depois de um vaivém de posições a respeito do indulto de Natal em 2018, Temer decidiu não assinar o decreto com o benefício, ele interrompeu uma prática existente desde a redemocratização.
Os advogados do preso ingressaram com um habeas corpus no STF em 27 de dezembro. Como plantonista da Corte durante o recesso do Judiciário, o presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, virou relator do caso e pediu à Presidência da República um posicionamento a respeito. A resposta foi encaminhada por Bolsonaro na terça-feira (8).
O preso que acionou o STF foi condenado a sete anos de prisão pelo roubo de um telefone celular em 2013, como consta no pedido de habeas corpus. No momento do protocolo do pedido, ele já havia cumprido cinco anos, dois meses e 12 dias da pena de prisão, o que, na visão da defesa, lhe daria direito ao indulto, caso Temer tivesse editado o decreto. O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) já havia elaborado a sugestão para a edição do decreto de indulto, mas Temer optou por não editá-lo, como afirmaram os advogados do detento.
Toffoli, então, decidiu ouvir o governo Bolsonaro a respeito. O parecer da Consultoria-Geral da União foi chancelado pelo novo advogado-geral da União, André Luiz de Almeida Mendonça. “O STF possui entendimento já consolidado no sentido de que a concessão de tal benefício configura conduta discricionária do presidente da República, cabendo somente a ele decidir ou não pela publicação do decreto de indulto, não havendo que se falar, portanto, em direito subjetivo ou compulsoriedade para a expedição da norma”, cita o documento da AGU encaminhado à Casa Civil.
A Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça também enviou um parecer à Casa Civil. No documento, ressaltou que o papel do CNPCP é apenas opinativo, cabendo ao presidente da República adotar a posição que entender como correta. O ministério afirmou ainda que a concessão do indulto é historicamente exercida pelo chefe do Executivo, sendo uma conduta “discricionária” do presidente da República.
Já o relatório da Casa Civil coube à Subchefia para Assuntos Jurídicos, chancelado pelo subchefe interino, Felipe Cascaes – remanescente do governo Temer. A Casa Civil apontou a existência de perda de competência no pedido de habeas corpus, uma vez que Temer deixou de ser presidente da República. Além disso, a decisão de não editar o decreto em 2018 foi uma “decisão política” de Temer, “ato inserido dentro do seu espectro de competência e que está dentro do seu juízo de conveniência e oportunidade”.
A Casa Civil também fez uma análise de mérito sobre o indulto. “Mesmo com fundamento jurídico distinto, a essência do instituto do indulto é mantida, é dizer, trata-se de ato discricionário e privativo do chefe do Poder Executivo, de modo que cabe ao presidente e tão somente a ele, não só realizar o juízo de conveniência e oportunidade quanto aos seus requisitos e ao seu alcance, como quanto à sua própria edição ou não.”
Os documentos encaminhados ao STF não dão qualquer pista sobre o que efetivamente fará Bolsonaro em relação à concessão do indulto. A discussão sobre o benefício passa pelo ministro da Justiça, Sergio Moro. Um mês antes de assumir o cargo, e depois da declaração de seu chefe de que não haveria mais indulto, Moro afirmou:
“A política do governo vai ser mais restritiva em relação a esses indultos generosos. Acho que essa generosidade excessiva não faz bem como política de repressão e combate ao crime.”
O indulto presidencial passou a ser um assunto polêmico depois do decreto de 2017, quando Temer ampliou as possibilidades de concessão do benefício a presos por corrupção. O presidente reduziu para um quinto o período de cumprimento de pena em casos de crimes sem violência ou grave ameaça, o que abarcava casos de corrupção, inclusive de condenados na Lava-Jato.
O decreto foi questionado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e uma liminar do ministro do STF Luís Roberto Barroso suspendeu os efeitos de parte do ato do presidente. Em julgamento em plenário em novembro do ano passado, adiado por um pedido de vista, a maioria dos ministros do STF já votou a favor da manutenção do decreto e de que a decisão de conceder ou não indulto é um ato exclusivo do presidente da República.
*Informações O Globo