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E-mails mostram que LaMia e corretora sabiam de proibições em voo da Chape

Informações UOL Esporte

Familiares das vítimas cobram soluções – Foto: Divulgação/ Chapecoense

Uma série de e-mails trocados entre a proprietária da companhia aérea LaMia, a venezuelana Loredana Albacete e o corretor de seguros da AON, o britânico Simon Kaye, demonstram que ambos sabiam das proibições para as operações da empresa boliviana que transportou a Chapecoense no voo que caiu no morro Cerro Gordo, em Medellín, na Colômbia, onde vitimou 71 pessoas em novembro de 2016. As informações foram obtidas pelo UOL Esporte e divulgadas nesta terça-feira (10).

Um dos exemplos ignorados por ambos é a proibição de que voos fretados sobrevoem o espaço aéreo da Colômbia. Além disso, as mensagens trocadas indicam favorecimentos políticos, desdém com a tripulação e um contato próximo com “aquela que cuida dos clubes de futebol”.

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Os e-mails estão numa série de documentos disponibilizados ao Senado Federal e foram obtidos pelo UOL Esporte que demonstram que a companhia aérea tinha seguro para a aeronave, a despeito das famílias ainda não terem recebido os valores sobre o acidente. Em um dos trechos, a negociação entre Loredana Albacete e Simon Kaye demonstra que a LaMia contava com uma série de voos futuros para convencer a AON a assegurar a nave. Apesar de ser uma corretora, a Aon foi a responsável pela apólice do seguro a partir de fundos vindos de Londres.


Foto: Reprodução/UOL Esporte

“Odeio pressionar você com tempo quando eu tenho atrasado nas respostas, mas não tenho opções. Vamos ter de assinar o contrato na segunda para a viagem de 10 de abril. (…) Espero que você entenda. É um cliente com alto potencial para nós. Eles lidam com todos os times de futebol e a temporada está começando”, escreve Loredana.

A referência é à Off Side Logística, empresa sediada no Rio de Janeiro que intermediou negociações com a Chapecoense e outros clubes. A viagem citada não ocorreu: era para o The Strongest, clube boliviano ir para a Venezuela, mas o seguro não saiu a tempo.

Outro cliente perdido foi o Rosário Central (Argentina), que iria viajar para Medellín em maio de 2016. A Colômbia proíbe que voos fretados sobrevoem seu espaço aéreo por temor de atos terroristas de grupos guerrilheiros contra essas aeronaves e, a partir disso, as companhias seguradoras não fazem apólices para aeronaves que sobrevoam o destino. Mas a LaMia conseguiu, mesmo com e-mails avisando que a Colômbia seria destino frequente. Ainda em abril, a AON, por meio de Kaye, dava sinal verde para a cobertura da nave:


Foto: Reprodução/UOL Esporte

“Querida Loredana, obrigado pelo seu e-mail. Vamos proceder para formalizar a indicação, obtivemos suporte da cobertura aérea”, diz a resposta, discutindo ainda uma queda no valor da cobertura, para que houvesse redução no custo da apólice: “Vamos investigar se tem alguma redução significante na cobertura entre US$ 25 milhões e 50 milhões, então você pode decidir qual o valor a comprar”. O texto de Kaye ainda faz alertas sobre voos para os EUA, mas não cita o espaço aéreo colombiano. No mesmo texto, o agente da corretora AON sugere retirar a cobertura de seguro da tripulação, o que não foi aceito por Loredana.

Pouco depois, nova resposta da proprietária da LaMia:


Foto: Reprodução/UOL Esporte

“Queridos. Obrigado pelos esforços gentis para uma solução viável em pouco tempo. Afortunadamente, estamos aptos a obter as permissões para voarmos Venezuela e Bolívia sem os certificados”, afirmou. Ela ainda contestou o valor da cobertura, tentando baixar o preço da apólice: “Eu acho US$ 50 milhões muito. Amigos da aviação que fazem América do Sul trabalham bem com US$ 25 milhões de limite”.

As trocas de mensagens demonstram que a empresa tinha influência política para convencer os clubes a voarem com sua aeronave. Até então desconhecida, a LaMia transportou desde a Argentina de Messi até a Chapecoense no voo que nunca pousou na Colômbia. Apesar dos diálogos demonstrarem que a AON sabia que a LaMia circulava em espaço aéreo colombiano, a empresa britânica hoje usa a proibição de voos fretados para aquele país como um dos argumentos para negar dialogar com as famílias das vítimas para o pagamento de uma indenização.

Além disso, a negociação pela apólice que viria a ser respaldada pela AON com corretagem da Bisa demonstra que havia facilitação na decolagem da aeronave à partir da Bolívia e que a redução no valor da cobertura serviu para apressar a emissão da apólice.

A AON, corretora de seguros britânica, avaliou riscos da eventual apólice e referendou o seguro para a aeronave da LaMia, a despeito dos riscos indicados, como a proibição de voos fretados para a Colômbia; os e-mails comprovam que a corretora sabia que o avião circulava o espaço aéreo colombiano.

Por meio de uma operação de resseguros no mercado de Londres, a AON garantiu à Bisa, seguradora boliviana, que pudesse emitir a apólice com valores abaixo dos praticados no mercado e com sugestões como a retirada da tripulação da LaMia da cobertura, recusada pela dona da empresa, Loredana Albacete.

Com a garantia da AON, a Bisa emitiu a apólice internacional para a LaMia, também ciente dos riscos. A Tókio Marine Kiln é citada como resseguradora em documento enviado às famílias para abatimento de dívida a título de “fundo humanitário”. A ideia é fazer com que as famílias abram mão da execução da apólice, cujo pagamento vem sendo negado pelas empresas.

Governos da Colômbia e da Bolívia se eximem de culpa e recusam dialogar

Com base nas mensagens fornecidas pela própria família Albacete, proprietária da LaMia, as famílias que perderam entes queridos no acidente da Chapecoense agora cobram responsabilização dos governos colombiano, boliviano e da AON, Bisa e Tokio Marine Kiln – esta, sediada na Inglaterra e citada como responsável pelo pagamento do tal “fundo humanitário” oferecido para as famílias no valor de US$ 225 mil para cada família, um valor diferente dos US$ 300 milhões que as famílias pleiteiam mediante o valor padrão de uma apólice aérea.

“A AON renova as apólices desde 2012, conhece o mercado de aviação, vinha com limite de 300 milhões de dólares e troca por uma de 25 milhões por qualquer motivo. Pense que o avião tivesse caído na cidade: US$ 25 milhões não cobrem as responsabilidades, já não cobre apenas com os passageiros; a AON conhece o risco, é a assessoria para seguros do cliente e oferece uma apólice menor”, argumenta Abel Dias, consultor especialista em seguros contratado pela AFAV-C (Associação das Famílias de Vítimas do Acidente da Chapecoense).

As famílias já convidaram as partes para audiências públicas no Senado e na Câmara. Bolívia, Colômbia e AON não compareceram. A cobrança quanto aos governos vizinhos se dá pelo aceite do plano de voo, sabedores de que não há seguro para voo fretado rumo à Colômbia, além da própria irregularidade do planejamento de combustível. Paradoxalmente, mesmo assegurando a nave, a AON argumenta que não poderia assegurá-la pela mesma regra.

Por meio de sua assessoria de imprensa, o escritório da AON em Londres se manifestou que “A AON atuou somente como corretora de resseguros, ou seja, intermediando e apoiando na colocação da proteção de resseguros para a companhia seguradora. Qualquer tratativa sobre indenizações e reclamações, e sobre as condições do programa de seguros, deve ser conduzida com o segurador do risco. A AON não comenta assuntos de clientes”.

A “engenharia” envolve diversas empresas de seguros. A Bisa, corretora boliviana, buscou o apoio da AON para vender a apólice; a Tókio Marine Kiln aparece no documento citado acima como operadora dos valores do “fundo humanitário”. “A corretora (AON) aceitou esse risco, recebeu a proposta e a emitiu. E nega o sinistro baseada na restrição territorial sabendo que tudo isso foi negociado, que iriam pagar. Sabiam que era usual voar para a Colômbia. Há uma culpa concorrente”, argumenta Abel Dias. As trocas de mensagens e o aceite para o seguro demonstram que todos sabiam dos riscos de que o Voo 2933 decolasse em 28 de novembro de 2016, vitimando 71 pessoas.

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