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A Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil foi instituída pela Medida Provisória nº 2002-2/2001. Visou-se, à época, criar um ambiente seguro de negócios jurídicos que clamavam por segurança suficiente para acompanhar a evolução tecnológica. E a assinatura digital permitiu que, tanto pessoas naturais quanto jurídicas, públicas ou privadas, pudessem realizar transações, imediatas e à distância, com segurança.
A ICP-Brasil é um sistema, via certificados digitais, que assegura a autenticidade destas assinaturas numa cadeira hierárquica de confiança. Estes certificados garantem o controle de autenticidade e o controle da integralidade. Ou seja comprovam que quem assinou o documento era, de fato, a parte interessada, ao tempo que comprovam que o documento assinado é o mesmo que as partes tiveram acesso, que não houve alteração do conteúdo entre a emissão, validação, envio e recebimento do documento.
Mas ainda que a ICP-Brasil seja o suprassumo da garantia em assinaturas digitais, a própria Medida Provisória nº 2022-2/2001 prevê, em seu art. 10, § 2º, que esta MP não obsta a utilização de outros meios de comprovação de autoria e integridade de documentos eletrônicos, ainda que não certificada pela ICP-Brasil. A ideia do legislador, parece, era reconhecer a ICP-Brasil como o modo mais protetivo de assinatura digital, porém sem considerá-la como único modo, desde que o outro modo escolhido seja capaz de demonstrar que a assinatura do documento expressa realmente a vontade das partes.
À época, já se previa que a livre manifestação da vontade, requisito indispensável à perfectibilidade dos negócios jurídicos, não demandaria forma especial, exceto nos casos previstos em lei (como por exemplo a compra e venda de imóveis por escritura pública). Essa premissa se confirmou no art. 107 do Código Civil, promulgado em janeiro de 2002 com vigência a partir de janeiro de 2023.
Mas ainda que a norma pareça de uma clareza absurda, o Poder Judiciário foi instado a se manifestar acerca da validade de um contrato eletrônico firmado em plataforma não vinculada ao ICP-Brasil. E o STJ entendeu que sim, a assinatura em plataforma não certificada é válida. O relatório é da lavra da ministra Nancy Andrighi no REsp 2159442/PR.
Colhe-se da decisão:
“A intenção do legislador foi de criar níveis diferentes de força probatória das assinaturas eletrônicas (em suas modalidades simples, avançada ou qualificada), conforme o método tecnológico de autenticação utilizado pelas partes, e – ao mesmo tempo – conferir validade jurídica a qualquer das modalidades, levando em consideração a autonomia privada e a liberdade das formas de declaração de vontades entre os particulares.
(…)
A assinatura eletrônica avançada seria o equivalente à firma reconhecida por semelhança, ao passo que a assinatura eletrônica qualificada seria a firma reconhecida por autenticidade – ou seja, ambas são válidas, apenas se diferenciando no aspecto da força probatória e no grau de dificuldade na impugnação técnica de seus aspectos de integridade e autenticidade. Negar validade jurídica a um título de crédito, emitido e assinado de forma eletrônica, simplesmente pelo fato de a autenticação da assinatura e da integridade documental ter sido feita por uma entidade sem credenciamento no sistema ICP-Brasil seria o mesmo que negar validade jurídica a um cheque emitido pelo portador e cuja firma não foi reconhecida em cartório por autenticidade, evidenciando um excessivo formalismo diante da nova realidade do mundo virtual”.
Mas qual seria o maior impacto desta decisão? Certamente aos brasileiros residentes no exterior, que não dispõem de tokens de acesso às plataformas credenciadas ao ICP-Brasil, especialmente em questões que envolvam representação, ou ainda alienação imobiliária.