A empresa Socicam venceu a primeira etapa do edital de licitação para a concessão do Aeroporto Serafim Enoss Bertaso, em Chapecó. Apenas duas empresas apresentaram propostas para participar da licitação, que concede à vencedora a administração do aeroporto para os próximos 30 anos. Na terça-feira (10) foram examinados os documentos. A outra empresa que participava do certame, Dix Empreendimentos Ltda, foi desclassificada por falta de documentação. Empresas chapecoenses contestam o edital de concessão e questionam que ele possui elementos específicos que limitam a concorrência e a disputa de preço. O Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (TCE) emitiu uma suspensão cautelar, para que seja dado um parecer técnico sobre as reclamações.
Conforme informações da Administração Municipal, o Consórcio Voe Xap – integrado pela SOCICAM Administração, Projetos e Representações Ltda e SOCICAM Infraestrutura e Participações Ltda – foi habilitado e apresentou proposta de valor de contrapartida pela concessão de R$ 8.116.000,00. O valor seria acima dos R$ 2.908.500,00 estabelecidos pela Administração Municipal. Depois de concluída essa etapa, o próximo passo é encaminhar as cópias dos documentos do processo licitatório para apresentar ao Tribunal de Conta do Estado de Santa Catarina e dar sequência à licitação, o que deve ocorrer na próxima sexta-feira (13).
Empresas contestam o edital
Empresas de Chapecó contestam o edital, que segundo elas, apresentam elementos específicos que limitam a participação no processo licitatório e direcionam, para apenas uma empresa se encaixar nos requisitos. O ClicRDC conversou com os advogados que representam duas empresas: Thiago Felipe Etges, da Guiar e Katriny Quagliotto da empresa Servioeste.
Segundo os advogados, entre os principais pontos questionados estão:
- Existem contradições nas exigências da qualificação técnica das consorciadas, pois em determinada parte exige que todas as consorciadas comprovem experiência técnica e em outro ponto diz que apenas a empresa que será a operadora aeroportuária deve comprovar experiência;
- Contradição no que se refere ao percentual de contribuição variável do concessionário. Ora diz em 3,25% e em outro momento fala em 3,3%;
- Ilegalidade na exigência de apresentação de carta subscrita por instituição financeira que declare a viabilidade da proposta financeira da licitante, pois viola o sigilo de proposta da concorrência pública;
- Ausência de informações relevantes no processo licitatório que dificultam e até mesmo inviabilizam a confecção do plano de negócios que deve compor a proposta de preços;
Segundo o advogado, Thiago Felipe Etges entre esses elementos limitantes está também a exigências de qualificação econômico-financeira, em que o capital social precisa ser de R$12,3 milhões para participar do processo.
A advogada Katriny Quagliotto ressaltou que são contestadas diversas exigências consideradas contraditórias dentro do edital e que impossibilita a confecção de proposta de preços adequada ao objeto licitado. “Contestamos também exigências que restringem o caráter competitivo da licitação”, disse.
“Nosso inconformismo é que essa mistura de exigências fez com que a licitação ficasse restrita a um número muito limitado, se não reduzido a um proponente capaz de participar do processo licitatório. O que aconteceu na licitação, ontem, deixa claro que não houve disputa de preço. Tivemos dois proponentes, um deles o consórcio formado pelas empresas Socicam, e outro proponente , a empresa Dix empreendimentos, que nitidamente participou da licitação somente para dizer que havia mais um concorrente. Porque essa empresa, quando foi analisada a documentação de habilitação, deixou de apresentar um documento que é fundamental no processo licitatório, que é a documentação de comprovação de qualificação técnica . Quando uma empresa, estabelecida no mercado, participa de um processo licitatório e deixa – voluntariamente- de apresentar um documento essencial do processo, fica claro que ela não queria disputar, que ela estava aqui somente fazendo número”, destacou Etges.
Socicam: Do estudo à concessão
Etges ressaltou que a empresa que ganhou o processo também foi a mesma que realizou o estudo de viabilidade de concessão do aeroporto para a iniciativa privada.
“Esse edital foi construído ao longo do tempo pela Administração Municipal, oriundo de um procedimento chamado de ‘proposta de manifestação de interesse’. Nesse procedimento, empresas privadas, em geral, tem que se disponibilizar perante a administração, para desenvolver estudos sobre serviços que podem ser entregues à iniciativa privada. No caso específico de Chapecó, em 2018, houve uma autorização pública para que empresas interessadas estudassem o aeroporto de Chapecó para a viabilidade de fazer uma concessão. Uma empresa que se habilitou para fazer esse processo foi à Socicam, sediada em São Paulo. Esse estudo foi elaborado, apresentado à Prefeitura, teve audiência pública ano passado e, a partir disso, foi publicado o edital do processo licitatório”, explica.
Recursos
Ambas as empresas protocolaram recursos na tentativa de que itens do edital fossem revistos. Entre as medidas estão: impugnação administrativa, mandado de segurança e uma representação feita também no Tribunal de Contas de Santa Catarina. O fato também foi noticiado ao Ministério Público, o qual instaurou Inquérito Civil.
“O que queríamos, com todo esse movimento, era permitir que houvesse uma disputa. Que outros interessados, capacitados para prestar o serviço e organizados em consórcios, pudessem disputar a concessão”, pontua o advogado.
Conforme informações da 10ª Promotoria do Ministério Público de Chapecó, o inquérito civil foi instaurado na segunda-feira (9). O objetivo é “apurar possíveis irregularidades no conteúdo do edital – que prevê a concessão para expansão, exploração e manutenção do aeroporto- que, em alguns pontos, dificulta – ou mesmo impede – a concorrência entre interessados”.
Etges disse que a representação ao Tribunal de Contas, em que relatava essas irregularidades procedimentais – gerou “uma decisão proferida ontem, que suspendeu o processo licitatório”. Segundo ele, a licitação está aberta, mas suspensa por ordem do Tribunal de Contas, que deve analisar e deliberar sobre as exigências do edital – que são questionadas.
Cenário privilegia a atuação de grandes empresas
O advogado Etges comentou que no Brasil, as primeiras concessões de aeroportos feitos no país foram dos grandes aeroportos. Sendo que até pouco tempo, não existiam operadores aeroportuários, porque os aeroportos eram todos administrados pelo Poder Público.
“Quando os grande aeroportos do país foram lançados para a iniciativa privada se criou um mercado que é integrado por grandes operadoras de aeroportos nacionais e internacionais. Quando entramos no segmento de aeroportos pequenos e médios, não existe um segmento empresarial estruturado para operar esses aeroportos. Tem grandes empresas que dominam e abaixo delas não existe ainda um mercado estabelecido. O que se espera com uma situação dessas? Que o Poder Público fomente a criação desse setor, o desenvolvimento desse segmento empresarial e para isso é importante que você tenha possibilidade das empresas médias participarem das disputas. O edital de Chapecó caminha, um tanto, na contramão disso, porque ele criou critérios absolutamente rígidos de comprovação de qualificação técnica das empresas”, comentou Etges.
Empresas locais teriam condições de atender a demanda?
Conforme a advogada Katriny, com a união de esforços de vários empresários de Chapecó, com a parceria de empresas que já possuem experiências em gestão de aeroportos, seria possível fazer uma gestão de qualidade em níveis de grandes aeroportos nacionais e internacionais.
“A Servioeste possui grandes negócios com aeroportos e parcerias com empresas operadores de aeroportos. Porém, o edital impediu que ao menos participássemos da concorrência”, ressaltou a advogada.
Ela destaca ainda, que seria interessante para o município ter empresas locais, ao invés de empresas de outros estados como vencedoras, justamente para fomentar a economia local.
Relação entre as duas únicas participantes do edital
Em pesquisa feita pelo ClicRDC na internet constatou que as duas empresas Socicam e Dix Empreendimentos já atuaram juntas em consórcios de outros aeroportos.
Segundo matéria publicada no dia 26 de fevereiro de 2019, pelo portal ClickPB, informava que o aeroporto Dragão do Mar (Aracati-CE) seria administrado pelo consórcio Ceará Aeroportos, formado pelas empresas Socicam e Dix Empreendimentos.
O ClicRDC entrou em contato com ambas as empresas. Na manhã desta quinta-feira (12) a empresa Socicam encaminhou nota sobre o assunto, na qual pontou que “a concessão do aeroporto de Chapecó está em linha com o plano estratégico de desenvolvimento de negócios da empresa. A Socicam acredita no potencial da região e ofereceu uma proposta financeira com ágio de 180% em relação ao valor mínimo esperado pela prefeitura”.
No entanto, a Socicam não comentou se firmou parceria anteriores com a Dix Empreendimentos, a outra empresa que participou do edital do aeroporto. A Dix ainda não se manifestou.
Confira a nota na integra:
A Socicam, líder na área de mobilidade e infraestrutura de transportes em terminais de passageiros na América Latina, é responsável pela gestão de mais de 130 empreendimentos, entre eles 14 aeroportos no território nacional, que respondem por uma movimentação anual de mais de oito milhões de passageiros. Essa marca faz da empresa a maior concessionária privada de terminais aeroportuários do País, com capital 100% brasileiro.
Com 48 anos de trajetória, a Socicam atua também na gestão de terminais rodoviários (ônibus intermunicipais) e urbanos, na gestão de terminais portuários de passageiros e na administração de postos de atendimento ao cidadão.
A Socicam já participou anteriormente de outros projetos de concessão e parcerias público-privadas (PPP’s) não apenas em Santa Catarina, mas também em toda a região sul. A concessão do aeroporto de Chapecó está em linha com o plano estratégico de desenvolvimento de negócios da empresa. A Socicam acredita no potencial da região e ofereceu uma proposta financeira com ágio de 180% em relação ao valor mínimo esperado pela prefeitura.
A prefeitura de Chapecó não respondeu todos os questionamentos do ClicRDC, mas divulgou a nota encaminhada na tarde de terça-feira (10), em que informava sobre o resultado das propostas participantes do processo licitatório.
Também destacou que “o edital, apresentado há 08 (oito) meses em audiência pública (julho de 2019), e depois republicado com novas recomendações do TCE, possibilitou aos interessados obter quaisquer esclarecimentos sobre o objeto, como mencionado nos itens 15.4 e 15.7, abaixo transcritos:
15.4 Os pedidos de esclarecimentos por parte das licitantes deverão ser formalizados por escrito, ao presidente da Comissão de Licitação, em até 3 (três) dias úteis antes da data estabelecida para a abertura da licitação, por meio de correspondência protocolizada na sede da Prefeitura Municipal de Chapecó, no endereço: Av. Getúlio Vargas, nº 957S, Centro, Chapecó-SC, CEP 89812-000 ou através do [email protected], seguindo o modelo integrante do Anexo I – Modelo de Cartas e Declarações.
15.7 Quaisquer esclarecimentos e correspondências dos licitantes e/ou interessados a respeito deste Edital bem como outras informações sobre o objeto da licitação serão prestados pela Comissão de Licitação, nos dias úteis, das 13h às 19h, na sede da Prefeitura Municipal de Chapecó, pelo telefone 3321-8455, pelo e-mail: [email protected].
Confira a nota encaminha pela prefeitura na terça-feira
A primeira fase do Edital de Concessão do Aeroporto Serafim Enoss Bertaso, de Chapecó, foi realizada nesta terça-feira, com a apresentação de duas propostas, uma pelo Consórcio Voe Xap, integrado pela SOCICAM Administração, Projetos e Representações Ltda. e SOCICAM Infraestrutura e Participações Ltda., e outra pela Dix Empreendimentos Ltda.
Examinados os documentos, a Dix Empreendimentos Ltda. foi desclassificada porque não apresentou a documentação exigida.
Resultado: o Consórcio Voe Xap, foi habilitado e apresentou proposta no valor de R$ 8.116.000,00, bem acima dos R$ 2.908.500,00 estabelecidos pela Administração Municipal.
Próximo passos: vencida esta etapa, na próxima sexta-feira técnicos da Prefeitura seguem para Florianópolis, levando cópia de todos os documentos do processo licitatório para apresentar no Tribunal de Conta do Estado de Santa Catarina e dar sequência à licitação.
Três outras empresas questionaram judicialmente o edital (Mandados de Segurança nºs 5005346-46.2020.8.24.0018/SC, 5005348-16.2020.8.24.0018/SC e 5005344-76.2020.8.24.0018/SC), não obtiveram êxito e não apresentaram proposta na concorrência.