Informações portal Metrópoles/ Agência Estado

Um homem e sua filha de apenas 23 meses deitados de bruços com rostos submersos às margens do Rio Grande. A camiseta preta dele está erguida até o peito com a cabeça da menina por dentro. O braço dela está em volta do pescoço do pai, sugerindo que a criança tenha se agarrado a ele em seus momentos finais.
A fotografia abrasadora da triste descoberta de seus corpos na segunda-feira (24), captada pela jornalista Julia Le Duc e publicada pelo jornal mexicano La Jornada, ressalta os perigos enfrentados por migrantes da América Central que fogem da violência e da pobreza e esperam encontrar asilo nos Estados Unidos (EUA).
De acordo com a reportagem de Julia Le Duc para o La Jornada, Oscar Alberto Martinez Ramirez, de 25 anos, frustrado porque sua família, de El Salvador, não conseguiu se apresentar às autoridades americanas para pedir asilo, decidiu nadar até o outro lado do rio no domingo com sua filha Valeria.
Ele a colocou na margem norte do rio e voltou para pegar a mulher, Tania Vanessa Avalos, de 21 anos, mas ao ver o pai se afastar, a menina se jogou na água. Martinez voltou e conseguiu pegar Valeria, mas a corrente levou os dois para longe.
O texto foi escrito com base no que Tania contou à polícia local em meio a lágrimas e gritos, segundo Julia Le Duc à Associated Press. Detalhes do incidente foram confirmados na terça-feira (25) por uma fonte do governo de Tamaulipas, que não estava autorizado a discutir o assunto publicamente e pediu anonimato, e pela mãe de Ramirez em El Salvador, Rosa Ramirez, que conversou com a agência por telefone. “Quando a menina pulou para dentro da água, ele tentou alcançá-la, mas quando tentou agarrá-la, foram para mais longe e não conseguiram sair”, disse Rosa à AP. “Ele a colocou em sua camisa, e imagino que tenha dito a si mesmo: ‘Cheguei até aqui’. E decidiu seguir com ela.”
Passagem mortal
Do escaldante deserto de Sonora até o Rio Grande, a fronteira entre EUA e México de 3.218 km tem sido frequentemente uma passagem mortal entre os pontos de entrada. Um total de 283 mortes de migrantes foram registradas no ano passado. O número deste ano até agora não foi divulgado.
Nas últimas semanas, dois bebês, uma criança e uma mulher foram encontrados mortos pelo calor sufocante; em abril, três crianças e um adulto de Honduras morreram depois que sua balsa virou no Rio Grande; e um menino de 6 anos da Índia foi encontrado morto no início deste mês no Arizona, onde as temperaturas sobem rotineiramente bem acima de 38°C.
A busca por Martinez e sua filha foi suspensa no domingo (23) à noite e seus corpos foram descobertos na manhã seguinte perto de Matamoros, México, em frente a Brownsville, Texas, a várias centenas de metros de onde eles tentaram atravessar e a apenas 1 km de uma ponte internacional.
As autoridades de imigração e defesa civil de Tamaulipas visitaram os abrigos que começaram a ser criados há algumas semanas para alertar contra a tentativa de atravessar o rio, que estaria muito cheio devido à água liberada das barragens para irrigação. Na superfície, o Rio Grande parece plácido, mas ele é formado por fortes correntezas. “É um rio muito profundo e muito perigoso”, disse Julia Le Duc.
Sonho de ter uma casa
Rosa disse que seu filho e a família deixaram El Salvador em 3 de abril e passaram dois meses em um abrigo em Tapachula, perto da fronteira do México com a Guatemala. “Eu implorei para eles não irem, mas ele queria juntar dinheiro para construir uma casa”, disse Ramirez.
O Ministério das Relações Exteriores de El Salvador disse que estava trabalhando para ajudar a família, incluindo a mãe, que estava em um abrigo de imigrantes na fronteira. Os corpos devem ser levados para El Salvador na quinta-feira (27).
A foto lembra a imagem de 2015 de um menino sírio de 3 anos, Aylan Kurdi, que se afogou no Mediterrâneo perto da Turquia, embora ainda não se saiba se ela pode ter o mesmo impacto em concentrar a atenção internacional para a migração aos EUA. “Muito lamentável isso ter acontecido”, disse o presidente do México, Andres Manuel Lopez Obrador, na terça-feira (25/06/2019), em resposta a uma pergunta sobre a fotografia. “Sempre denunciamos que, como há mais rejeição nos Estados Unidos, há pessoas que perdem suas vidas no deserto ou ao tentar atravessar o rio.”